O Brasil é o país da América Latina possuidor do maior rebanho de equinos e o terceiro mundialmente, com um total de 5,9 milhões de animais, perdendo apenas para China e México. O mercado movimenta cerca de R$ 16,5 bilhões anualmente e proporciona cerca de 3,2 milhões de empregos.
De acordo com a contínua necessidade de alcançar o melhoramento genético dos animais, o avanço no desenvolvimento das tecnologias de reprodução assistida no final do século XIX possibilitou significativo progresso na indústria da reprodução equina. Dentre elas se encontram a inseminação artificial, congelamento de sêmen, transferência de embrião, transferência de oócito e injeção intracitoplasmática (ICSI), clonagem; no qual possuem o objetivo de aumentar o valor potencial da progênie; possibilitar o uso de animais com algum problema reprodutivo; descartar a necessidade de locomoção dos animais para outros lugares; permitir o uso de éguas em competição e até mesmo possibilitar a produção de um animal que já morreu.
Portanto, o objetivo dos veterinários, criadores e proprietários de qualquer empresa da reprodução equina é produzir a maior quantidade de potros saudáveis durante a estação reprodutiva.
Aspectos fisiológicos da égua
As éguas têm a puberdade iniciada por volta de 10 a 24 meses de idade, sendo esta variação afetada pelo status nutricional, peso, raça, data de nascimento e comprimento do dia. São classificadas como espécies poliestricas sazonais e monovulatórias, apresentando apenas um folículo dominante recrutado por onda folicular. No entanto, podem haver casos de múltiplas ovulações.
O principal controlador da sazonalidade equina é representado pelo fotoperíodo (luminosidade relacionada com o comprimento dos dias). As éguas possuem ovulação espontânea e apresentam atividade sexual nos meses de primavera e verão (dias mais longos, com maior fotoperíodo), classificados como a fase cíclica da égua e denominados como o período da estação reprodutiva e um período acíclico fisiológico nos meses com dias mais curtos e com menor fotoperíodo (outono e inverno); contudo, outros fatores também podem influenciar o ciclo estral como escore corporal, estresse e a temperatura ambiente.
Em média, o período da estação reprodutiva, ou estação de monta, ocorre de outubro a maio no hemisfério sul, com aproximadamente 8 a 12 ciclos e apresentam significantes variações entre as éguas.
Ao longo do ano as éguas passam por duas fases transicionais, a primeira ocorrendo após o anestro de inverno, iniciando seu período cíclico na primavera com continuidade no verão e a segunda no início do outono, quando a égua retorna ao período cíclico novamente pós anestro do inverno.
Os ciclos estrais ocorrem em intervalos regulares com média de duração de 21 dias e podem ser divididos em dois estágios, sendo eles, o estro (cio) e o diestro. O estro é caracterizado pela predominação do estrógeno, caracterizado também pela demonstração de receptividade sexual da égua, com duração aproximada de 4 a 7 dias, contudo, esta variação pode ser maior, principalmente no início da estação reprodutiva; já o diestro, fase progesterônica, tem duração aproximada de 14 a 15 dias e a fêmea não fica receptiva ao macho.
Durante a fase de estro o trato reprodutivo das éguas apresenta aumento no tamanho do ovário com a presença do folículo pré ovulatório, útero mais distendido, flácido e com presença de edema, cérvix relaxada, flacidez na vagina com presença de secreção mucoide (na maioria das vezes) e as éguas em estro costumam urinar e expor o clitóris com determinada frequência. No entanto, no diestro, o ovário que possui o corpo lúteo se apresenta menor e mais consistente, o útero se encontra tubular, menor e com tônus, cérvix tubular, com maior firmeza e fechada.
À medida que ocorre a diminuição do comprimento dos dias é sugerida como primeiro sinal para o fim das atividades reprodutivas da égua na estação de monta, sendo denominada como anestro sazonal, período este caracterizado por ovários pequenos e inativos devido a estímulo insuficiente por gonadotrofinas, ocorrido nos meses de inverno.
Transferência de embriões
A técnica de transferência de embriões (TE) em equinos vem sendo utilizada em larga escala em programas comerciais nos últimos anos. Esta biotecnologia se resume em coletar um embrião de uma égua geneticamente superior, denominada doadora, e a transferência deste para outra égua que leve a gestação a termo, denominada receptora.
Portanto, as características e a constituição genética do potro não terão nenhuma semelhança com a égua receptora, e sim, com a égua doadora que produziu o oócito e o garanhão cujo sêmen foi utilizado para fecundá-la.
Esta técnica possibilita a produção de mais de um produto de éguas de alto potencial genético que estejam em carreira atlética, éguas incapacitadas de levar uma gestação a termo, potras muito novas para conceber e permite que potros filhos de éguas idosas tenham melhores condições de desenvolvimento pré e pós parto, além de poupá-las diante de dificuldades de levar uma gestação a termo e amamentar.
A TE em equinos é uma técnica de boa aplicação prática pelo fato do embrião, nesta espécie, permanecer com mobilidade total no útero da égua nos primeiros 15-17 dias de gestação. O embrião migra de um corno uterino ao outro e não forma nenhum tipo de anexo embrionário ao endométrio da mãe, possibilitando a transferência do mesmo de uma égua para outra.
Inúmeros fatores influenciam o sucesso de um programa de TE em equinos, como a qualidade do sêmen do garanhão utilizado, correta manipulação do sêmen, idade da égua doadora, dia da coleta, seleção da receptora, manipulação do embrião, entre outros.
A escolha da égua receptora é de extrema importância para este programa, é baseada em aspectos como idade, tamanho, balanço energético positivo, status sanitário e reprodutivo, docilidade, aptidão materna e condição corporal, aliados a um correto manejo são requisitos indispensáveis para o sucesso no programa de TE, possibilitando elevadas taxas de prenhez e reduzindo a perda embrionária.
Sincronização doadora x receptora
A espécie equina é considerada como uma das mais fáceis de se trabalhar quando se fala em sincronização entre doadoras e receptoras e também comparado às outras espécies domésticas. A sincronização do ciclo estral entre as éguas é uma ferramenta que otimiza a mão de obra e o acompanhamento da fase do ciclo estral e da ovulação destes animais. Alguns obstáculos podem ser encontrados devido à sua prolongada fase folicular, pois a ovulação pode ocorrer em um grande e variado espaço de tempo. A importância de manter uma janela ideal de sincronia entre doadoras e receptoras ocorre devido à ação da progesterona que realiza modificações no ambiente uterino, indispensáveis para a manutenção da gestação. O útero deve apresentar sincronia com a idade do embrião para oferecer condições ideais para a sobrevivência do concepto.
A sincronização das éguas é uma das etapas mais importantes dentro de um programa de TE. As éguas devem ser acompanhadas rotineiramente por exames de palpação transretal e ultrassonografia do trato reprodutivo. As doadoras devem der examinadas no mínimo uma vez ao dia depois que o folículo dominante é identificado, momento de extrema importância para a decisão sobre o dia ideal da inseminação artificial (IA) ou monta natural e a avaliação do dia correto da ovulação, denominado dia zero (D0). Normalmente, o intervalo de sincronização utilizado é aquele no qual as receptoras se encontram entre o 3º e 8º dia de ovulação (relacionado com o D0 da doadora), sendo a coleta do embrião realizada com 7, 8 ou 9 dias após a ovulação.
Éguas em anestro ou fase transicional também podem ser utilizadas como receptoras em programas de TE, desde que sejam submetidas ao ciclo artificial com tratamento hormonal (estrógeno e progesterona). Entretanto, essas éguas devem ser mantidas na progesterona até 120 dias de gestação, caracterizado pelo momento em que a placenta assume a produção deste hormônio.
Colaboração: Ricardo Nabas, médico veterinário